domingo, 25 de janeiro de 2009

Triste. É assim que eu me sinto quando preciso me despedir dos meus sentimentos. Da última vez que nos encontramos talvez eu não tivesse a real dimensão do que se instalaria no meu coração depois de nos despedirmos.

As vontades compartilhadas, os sorrisos trocados, o humor fino e os olhares que se cruzavam e corriam pra se evitar não negavam que o que sentimos um pelo outro, assim que nos vimos, foi identificação. E o que um não tinha se bastava no outro.

Sabe, com você eu me senti completa. Nunca ninguém conseguiu me deixar tão a vontade para que eu fosse eu. E eu nunca imaginei que existisse alguém com o seu sorriso. O sorriso que você me deu durante toda aquela última vez.

Eu não disse, mas eu queria você pra sempre depois de te encontrar pela última vez. Nos meus sonhos você volta pra dividir um abraço e conversarmos rindo, jogados no sofá. A chuva cai lá fora em compaixão a minha tristeza. Me pergunto onde você está que não aqui, do meu lado. Fico me perguntando quando foi que te perdi, mas a verdade é que nunca te ganhei.

Sei pouco pra dizer que compreendo, que estamos em diferentes fases de vida. Que você ainda tenta se livrar das cinzas de um incêndio recente da sua alma e que ainda quer acreditar que, com cinzas, se constroi um castelo. Só sei sobre mim. Que estou sentada na janela, vendo a chuva passar. É, parece que nem tudo dura pra sempre. Vai passar. Digo isso com os olhos meio mareados, mas minha alma está tranquila.

Queria ter te encontrado pelo menos mais uma vez, pra ter oportunidade de me despedir. Certas coisas, até algumas não começadas, deveriam ser terminadas. Queria saber como você anda, o que tem feito nas suas noites de chuva, nas manhãs de segunda. Se prefere café amargo ou chá. Queria que você se entregasse inteiro, como me entregou o seu sorriso. Mas sei tão pouco...

Depois da última vez que nos encontramos, precisava de mais uma. Não pra dizer tudo que eu não disse, nem pra escutar em palavras o que o silêncio diz. Precisava dos seus olhos sem evitar os meus, pra ter certeza que a última vez que nos encontramos não foi a primeira. E que eu não vejo nada além do que os seus olhos quando você me olha...


[Saudades do seu sorriso, menino desconhecido]

Uma semana depois

E pela primeira vez depois de muito tempo, ela disse sim. Sem pensar no que seria, nos porquês, se já conhecia ou se deixava de conhecer. Disse sim a ela mesma. Não fazia mais diferença se os outros entenderiam ou não. Não era questão de entender. Ela só se sentia viva.

Depois de muito tempo ela precisava fazer aquilo por si e não pelos outros. Tomou banho, vestiu um decote, passou lápis nos olhos e calçou sandálias pretas e altas. Aumentou o som do rádio, fechou os olhos e soltou o corpo no ritmo da música que tocava. Ninguém estava vendo.

Muitos minutos depois do horário marcado, o telefone tocou. Nenhum nome no visor, só números. Ainda não se conheciam. Ele a esperava na frente do prédio. Ela desceu as escadas devagar, sentindo uma mistura estranha de sentimentos em relação a si e sensações antigas que pareciam novas, depois de quase esquecidas. Desceu as escadas rindo. O que será que era tudo aquilo?

Respirou fundo nos passos que separavam o hall de entrada e o portão do prédio, numa tentativa quase frustrada de disfarçar tudo aquilo que nem ela sabia o que era. Olhou pelo vidro do carro para se certificar que era ele. Sorriu. Sorriram sem se conhecerem. Era ele, ela sabia.

Entrou no carro, tomou cuidado para não falar sem parar sob o efeito da ansiedade. Ele era mais bonito do que ela imaginou. Conversaram durante todo o caminho. Nunca teve problemas para conversar sobre tudo ou sobre qualquer coisa e mesmo assim parecia tudo diferente. Como se já se conhecessem. Como se… E não se conheciam até então. Como? Só até então.

Chegaram. Foram para a fila da balada da moda, onde todos, já na fila, se preocupam só em como alimentar o ego por algumas horas. Ele, preocupado dela não gostar, já que ela gostava mesmo dos bares com mesas na calçada e cerveja gelada com amigos dividindo a vida. Ela, despreocupada. Já se sentia viva e isso bastava.

Entraram. Ele perguntou por que ela tinha resolvido ir pra um lugar que teoricamente ela não gostava com alguém que ela não conhecia. Ela riu e respondeu que foi porque ele tinha chamado. Ela só disse sim. Não havia porquês.

Conversaram a noite toda, mesmo com a música alta. Beberam vodka a noite inteira e sorriram a noite inteira. Para eles e por eles. Já se conheciam. Ele contou sobre histórias passadas. Ela falou sobre ela. Sobre o que pensava do que ele contou. Na verdade, ela falou sobre si, só não sabe se ele soube naquele momento. Falou sobre muita coisa que ela não lembra e que o deixaram com os pensamentos embaralhados. E ela só soube porque ele falou: “estou meio atormentado com tudo o que você disse, preciso pensar”. E neste momento ela já não sabia quais as palavras exatas que ela usou, mas não perguntou.

A noite passou rápido a partir disso. Ele bebeu uma garrafa de água e ela, mais uma vodka. E, a partir disso, ela não lembra de mais nada. Voltaram juntos. Conversaram no caminho e ela só lembra dela sorrindo e falando, da música que tocava no rádio e dele prestando muita atenção. Não lembra de nenhuma palavra, só do que passou pela sua cabeça e pelo seu coração.

Ele estacionou na frente do prédio dela. Ela se despediu três vezes, que era pra dar sorte. Ele não subiu. Ela desceu do carro rindo. Não precisava disfarçar, estava de costas. Não se beijaram. E a noite foi perfeita. Se conheceram. Era ele.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Se não fosse cômico

Querido diário, se não fosse cômico, seria trágico. Ainda me surpreendo com certas coisas que acontecem na minha vida. Ainda nesta semana me disseram que eu deveria escrever um livro. Não pela forma bonita de escrever mas pelas histórias que eu tenho pra contar. Se fossem inventadas, não seriam tão criativas e surpreendentes. Ameaço dizer que engraçadas, mas só depois que elas passam.

Tudo começou a uns dez dias atrás. Bi bi bi, blá blá blá, tec tec tec. Ele escrevia de uma forma envolvente, parecia tão bonitinho pelas fotos e eu tinha tão pouco a perder. E é nessas horas que a gente esquece do que poderia estar fazendo que se envolve devagar, sem quase perceber. Os dias nublados e sem graça já pareciam quase azuis e eu já estampava um sorriso bobo no rosto. É, acho que no fundo mesmo escolhemos aquilo que queremos acreditar e sentimos só o que desejamos sentir. Pelo menos por algum tempo. Depois aceitamos que doce mesmo é a realidade, com cada uma das suas imperfeições.

Não aconteceu quase nada. Só conversas fragmentadas desconexas e textos coloridos dele que eu lia para poder me identificar com flores. Não havia promessas nem motivos para eu me sentir alheia ao mundo preto e branco, da forma que eu estava. O reconhecia a cada frase, no acaso e nas coincidências e ia traçando seu esboço e dando mais vida a ele através da imagem que eu construía.

Vamos nos conhecer, um dia. Mas aquele dia, sem data, sem hora nem local me parecia uma promessa vaga diante de uma “possibilidade de amor”. E das nossas pequenas diferenças interessantes, esta foi a que me chamou mais atenção pela incoerência. Não pela discordância entre eu e ele. Mas por ele negar ele próprio, que fazia questão de se mostrar sempre com as janelas abertas. Quase como redenção, foi ele quem falou sobre a noite, a sexta, a estréia e a esquina.

Me desesperei. De mais a mais, não queria uma possibilidade de amor com hora, data, assunto e local marcados. Reagi de forma previsivelmente louca, e tratei logo de manter o amor só como possibilidade. Meu medo ainda não conversa com a realidade. Era aquilo – quando passa a existir a mínima probabilidade, vou lá e estrago tudo. Não foi a primeira vez.

Eu já estava dentro de um buraco com a minha vergonha, dividindo com ela o silencio que falava sobre minhas frustrações e limitações . Não queria remendar os cacos que sobraram. Um remendo geralmente é pior que o estrago. Me retirei a minha insignificância quando, já acostumada aquele cenario, ele me chama.

Suas frases soltas não diziam quase nada de nada. Eu já havia desistido e me conformado. “Melhor mesmo é uma sessão sozinha”, eu repetia para me enganar. E ele ali, mudando os planos que já não existiam mais. Reli o diálogo de frases curtas e desculpas esfarramadas cuidadosamente escolhidas para se mostrarem assim e sorri. Primeiro de uma forma acanhada. Depois ri sozinha, um riso que libertou eu e a minha vergonha do buraco. Brincamos de tentar descobrir qual dos dois sofria mais de delírio e alucinação. E qual das duas reações era mais espontânea e criativa. Ridículas!

Em alguns minutos já sentia o tempo, a distância e as diferenças maiores entre nós dois. Certas coisas acabam sem terem começado. Mais uma vez eu estava sozinha. Eu e meu medo. [Que, no fundo, acredito não ter me deixado viver só das possibilidades.]

Fechei as janelas, peguei as chaves e fui assistir a estreia, em outra esquina. Sozinha. Deixei meu medo em casa, já não precisava me proteger. Guardei os detalhes das desculpas esfarradas como os melhores de todos os tempos e fui perseverante com o desespero da minha reação surtada.

Em casa, depois da chuva que caia na noite quente, sorrio. Dormirei por esta noite.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Dia arrastado, madrugada finda

Chegou em casa esgotada. Aquele dia começou cedo, com gente demais falando às oito da manhã. Ela só precisava de um banho demorado e um café forte para se sentir viva e recomeçar a semana que já tinha começado. Aliás, ela mal sabia que dia era aquele. Já não conseguia mais viver de noites em claro e amores inventados. Precisava de noites de sono, de sonhos tranquilos e o ombro de alguém para se encaixar e esquecer de tudo, para poder só sentir.

O dia passou arrastado. Em alguns momentos suspirava fundo, lembrando do que não foi e tentando empurrar mais rápido aquele dia que começou cheio de vozes que ainda não haviam se calado. Já estava esgotada antes de chegar em casa.

Chegou, tirou as sandálias de salto, se olhou no espelho. Continuava inteira. Sorriu um sorriso espontâneo e lembrou que, apesar de não conseguir mais viver de amores inventados, os adorava.

Chegou e saiu. Precisava conseguir viver de outra forma. Um amigo de longa data, uma noite quente, uma mesa na calçada, dois copos para fazer um brinde. Brindaram a vida, os tempos que não voltam mais. Falaram deles, de cada um e dos dois, dividiram e somaram. Chegaram a dividir o sofá para rir abraçados. Tão bom não sentir medo de gostar de alguém!

Se despediu já quase renovada e se viu sozinha, como sempre pareceu estar. Ainda vivia de amores inventados mesmo sem conseguir. Não conseguiu dormir por mais esta noite. Ficou imaginando em como seria aquele novo amor, que só conhecia por entre as palavras. Imaginou o que sentiria nos seus braços, se beijariam assim que se vissem? Ela não sabia e sorria mesmo assim. Sabia quase como era estar frente a frente com ele, olhar nos olhos, ter seu rosto nas suas mãos, a textura da sua pele. Compartilhar o silêncio e o sorriso. Sabia exatamente como ele a abraçaria pela cintura e a puxaria pra mais perto de ti. Riu um riso quase triste, imaginando que ele talvez nem existisse.

Lembrou dos seus amores inventados passados e de todos os finais infelizes. Como poderia ser diferente? Ela não sabia responder. Ah, queria tanto não querer... Mas, sem querer, já pensava nele.

Quando o sol já ameaçava nascer, choveu. Uma chuva para acompanhar suas lágrimas, pensou. Deitou para dormir algumas horas antes de recomeçar outro dia. Fechou os olhos e prometeu a si que seria tudo diferente. Que viveria para conseguir amar de verdade. Abriu mão da madrugada de brilhos finitos demais para ela e adormeceu.

Desistiu.

domingo, 11 de janeiro de 2009

...

Dos gestos espontâneos, aquele que mais me faz sorrir é o iniciado antes de suspirar fundo e o coração parar de bater. Termina com um ponto, aproveitando o entre-vírgulas.

Mas certos gestos espontâneos não passam só de impulsos. Espasmos. Um "buh", bom ou ruim. Que morre no raso e cai no óbvio.

O espontâneo flue, emenda uma coisa na outra, sem quebras e sem quinas. Sai assim, sem querer: sorrindo, vivendo, dançando, abraçando, gerundiando. E leva na valsa qualquer te-re-tê-tê. Não desvia, só improvisa. Dissimula com malandragem, mas é só exclamação. Nada de interrogações e reticências para a espontaneidade.

Agora misture o intenso ao espontâneo. Multiplique tudo por cinco, pinte de cores vivas e fortes e feche os olhos para sentir melhor. [Confesso que, nesta parte, respiro fundo e tento disfarçar meu sorriso de culpa e de gosto, típico dos dias em que tento esconder o que eu fiz!]

Muitas vezes, se você for assim e não souber, desconfie quando quase toda a sua platéia ficar chocada e só um ou dois indivíduos não esboçarem reação. Um deles provavelmente é desligado demais e, com alguma sorte, o outro te entenda.

Demoraria uma vida para tentar descrever todas as formas, texturas, gostos e cores quando se mistura intensidade e espontaneidade. E, ainda assim, eu morreria frustrada. Aceito gostar e ser aquela única pessoa da platéia.

Mas não aceito o impulso, o susto e os espasmos. Um suspiro fundo no fim de uma tarde quente, ensolarada e azul. Um suspiro antes da morte. É tão difícil de aceitar, sabia? Diante de todo aquele cenário lindo, a morte. Uma ameaça de coisas boas para nada.

Eu aceito o não. O sim, eu também aceito. Mas só quando carregam significados, afirmam ou negam seja lá o que for. Qualquer um deles pode fazer doer ou fazer sorrir, para quem diz ou para quem fala. Palavras verdadeiras, curtas. Três letras para cada uma delas e elas podem começar ou destruir um mundo. Intensas. Sim, muito intensas.

Impulsos e espasmos evitam o sim e o não. Evitam endereços certos. Impulsos e espasmos são sempre saudades e nunca um horário para se encontrar. São quase sempre amigos daqueles homens que adoram seduzir. Que falam palavras bonitas e soltas, confundem pensamentos e inflam sensações, roubam promessas de abraços que se tornariam verdadeiros, que fazem por impulso. Depois disso, acaba. Se esvai. Como se tirassem o som no melhor da festa. E o impulso, que no começo parece intenso, é quem mata a espontaneidade, não deixa ela acontecer.

Certos medos sufocam a intensidade, fazendo-a impulso e morte da espontaneidade. Muitas pessoas preferem o silêncio a dizer sim e não. Eu prefiro o não e o sim. Mesmo que existam aquelas tais mudanças no meio do caminho.

Quem nunca quis num minuto e depois não quis mais? Quem nunca pediu uma cerveja e, quando ela chegou, percebeu que precisava mesmo era de uma vodka?

E por dizer sem querer que queremos o que nunca quisemos, o que mostramos(por impulso e por vaidade), é óbvio, se torna raso. Toda a beleza que as vontades tentaram mostrar se esvai. Por espontaneidade insuficiente de dizermos o que sentimos. E por separar tanto o que já me confundiu, assim que te senti, mesmo sem te ver, tive certeza: "primeiro eu quis e depois não quis mais tomar uma cerveja. [Mudei de idéia, minha flor!]."

E, por saber que não iria escutar, mudei de idéia eu. Pra você poder não se tornar óbvio e nem me assustar, num impulso.

Vestindo meu melhor sorriso

Noite de ontem, insônia. Olhei em volta tentando identificar algo fora do lugar. Já terminava uma semana assim. Nada em volta parecia ser motivo ou desculpa para roubar-me tanto. Criei coragem, fechei os olhos e olhei pra dentro.

Ameacei abrir os olhos para deixar de ver. Resisti até tornar-se quase insuportável. E, nesse momento, permaneci de olhos fechados. Ah, o insuportável! Como eu precisava dele…

Durante algum tempo vivi meus dias para organizar meus sentimentos. Discuti muito as minhas relações internas. Olhei cada pedacinho de mim com cuidado e até criei um certo carinho por eles. Me livrei de mágoas e rancores que sujavam as minhas cores. Apesar que nunca fui muito de mágoas e rancores. No fundo, só me sentia cheia de entulhos, de coisas desorganizadas e mal resolvidas. E cismei que eu teria que organizar e resolver cada uma delas.

A cada uma das minhas inseguranças eu dei um nome. Talvez como quem busca ter domínio sobre elas. Dobrei bem pequenininho cada um dos meus amores mal resolvidos e os guardei, empilhados, debaixo da cama, bem lá no canto. Fora do meu campo de visão. E em cima da pilha colei um post-it verde limão escrito “arquivado”. Acendi uma vela para os meus fantasmas e pintei as paredes do meu quarto de branco. Tirei o pó dos móveis e estiquei s rugas da minha alma, recém chegada da lavanderia.

Frequentei as sessões de terapia religiosamente. Toda santa-quinta. Aceitei que nenhum emprego deve ser assim tão legal, já que deve ser um pouco difícil te pagarem bem pra te verem feliz.Me matriculei na academia. Já me olhava no espelho com certa vaidade e um sorriso educado e abafado no rosto.

Chorei algumas vezes por encontrar lugar algum para certas vontades, sensações, anseios. Algumas vezes parecia que faltava espaço dentro de mim praquilo tudo. Mas nada como priorizar certas coisas e abafar outras.

Pronto. Nada fora do lugar. E me vi ontem com insônia depois de toda uma semana assim.

Quando fechei os olhos vi exatamente assim: nada fora do lugar. Não faltava nada. Parecia que cada parte minha estava encaixada perfeitamente, sem frestas. E estava tudo tão fosco. Tão exatamente cada qual no seu cada qual que não me reconheci. Paralisei diante da irrealidade que eu havia me tornado. Percebi o quanto, agora, eu tinha medo de tocar tudo aquilo que construí. E o que restava era medo de estragar o que eu tinha demorado tanto para colocar no lugar. Sem frestas, não sobra espaço para dilatar.

Diante daquela sensação de sufocamento, fiquei ali, de olhos fechados por um minuto. Chorando lágrimas delicadas. Já não sabia deixar transbordar, chorar soluçando, viver o caos que durante muito tempo atrás eu chamei de meu. Eu queria o meu caos de volta. Era dele que eu precisava para que aquelas noites de insônia fizessem sentido. Queria ter a certeza do meu sorriso no outro dia quando, depois das poucas horas dormidas, eu acordava com a sensação leve de ter passado por tudo aquilo e continuar ali. No fundo, eu gostava de me reconhecer no exagero de uma noite transbordada.

Chorava um choro abafado. E percebi quanto tempo sorri abafado também.

Conforme conseguia me manter de olhos fechados, olhando para tudo aquilo separado por cores, tamanhos e tipos, em ordem alfabética sem sentido, comecei a organizar tudo, de forma bagunçada. Eu sempre preferi as cores misturadas e olha o que eu tinha feito comigo! Me vi num mundo monocromático, colorido só em tons pastéis degradés. E eu sempre gostei de vermelho, azul turqueza, verde bandeira, amarelo ouro.

Fui tirando tudo do lugar, abrindo frestas, deixando espaços abertos. Desdobrei meu caos e o pendurei na parede e do lado escrevi “aqui jaz o branco”. Misturei as cores de novo. E dormi.

Acordei e lembrei de ter soluçado baixinho na noite anterior. Transbordado. Sorri decidindo que as manhãs das santas-quintas serão só para curar minha ressaca, seja do que for. Chega de tentar entender tudo sempre, banalizar a minha loucura e enaltecer a mediocridade da normalidade. Não sou eu quando sou assim.

A minha bagunça já não é a mesma de antes. Cheguei a jogar certos textos, pretextos e sentimentos quando resolvi acreditar que o meu mundo deveria ser branco e rosa. Mas o vermelho, o azul turqueza, o verde bandeira e o amarelo ouro já pintam as minhas paredes. E no chão encontro certos gestos de melancolia que pisarei de vez em quando.Por felicidade ou rancor.

Rasguei todos os manuais. Vou aprender vivendo. Não quero aprender nada antes pra viver depois. Sou o tipo de pessoa que dá a cara a tapa e não liga de conviver com o seu hematona por algumas semanas caso leve uma surra. Eu ainda gosto de sair na chuva e sentir na pele a chuva em mim. Olhar pela janela já não tem mais graça. No outro dia vem o sol e seca tudo, não tenho medo. E molhada, o sol será mais quente pra mim.

Eu preciso chorar de soluçar as minhas insônias. Transbordar. Isso pra mim é viver.

Tanta segurança me engessou. Paralisou o meu sorriso. Desacelerou o sangue vermelho vivo das minhas veias que faziam pulsar meu coração. Da janela, a chuva não é tão fria e muito menos, o sol tão quente. Não nasci para separar o mundo em certo e errado. Nem pra colocar sentimentos em ordem alfabética. Eu vivo de muitos exageros e certos cuidados me bastam. Eu gosto de dançar na sala de casa, ou na praça ou na rua, no improviso, ao som que o mundo me oferece. Me mata pensar em dançar uma valsa num salão onde todos vestem traje de gala, tão iguais a passos ensaiados.

Acordei e saí. Fui viver. Segura só de que meus dias seriam, a partir de então, vividos em cores vivas. Acordei e saí. Vestindo meu melhor sorriso.

sábado, 10 de janeiro de 2009

E bem de vez em quando...

Bem de vez em quando, você me visita nos meus sonhos. Cruza meus pensamentos. Rápido. Questão de milésimos de segundos.

Talvez por tudo que não foi, pelo que tanto quis. Talvez não. Talvez não seja pelas fantasias não vividas. Talvez seja só pelo gosto do seu beijo que eu ainda não esqueci. Cada um deles. Cada vez que não me deixavam pensar em nada e só viver cada momento em cada centímetro do seu corpo.

Mas se eu tivesse que apostar em um por quê, resumir em uma só palavra, em um substantivo concreto, eu diria: seu rosto. Não pelos traços, nem pelo sorriso e pelos olhos. Nem pelo conjunto. Mas pela sua barba por fazer, que você sempre achou que me incomodava.

Em cada um dos milésimos de segundo sinto por um minuto inteiro minha espinha arrepiar da cintura a nuca. Endireito a postura e ainda tem dias que fecho os olhos e enclino a cabeça devagar pro lado esquerdo, como quem espera você chegar mais perto, a ponto de sentir a sua respiração levemente mais ofegante. Meu pescoço se confundindo com a sua boca, antes das nossas bocas se juntarem numa coisa só. E era só o início de tudo. [Um beijo no pescoço nunca para num beijo no pescoço!]. Questão de pele.

A sua barba por fazer me fazia cócegas. Eu arrepiava, me sentia mais leve. E sorria. [Como estou sorrindo agora, nesse milésimo de segundo].

Não é história mal resolvida. Já me livrei de certos fantasmas. Quase não sinto mais todas as borboletas no estômago que você me trouxe. Já existem poucas. Mas vira e mexe elas brincam e me confundem com o azul e lilás das suas cores. Cores vivas [suspiro eu!].

Já não restam palavras engasgadas. Escrevi todas cada vez que me sufocavam. E você se afastava devagarinho cada vez que isso acontecia. Pra não me machucar, você me disse algumas vezes. É, você nunca mentiu pra mim. E hoje cada qual está na sua dimensão exata. Me sinto bem nessas suas ausências eternas. Já nem acho que seríamos perfeitos juntos. Já fomos.

Mas bem de vez em quando, você ainda me visita. E eu abro um sorriso nesses milésimos de segundo que são seus. Nossos. [E isso, você não me tira].

Saudades dos nossos silêncios compartilhados, madrugadas atravessadas e pernas trocadas.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Para você

E te ofereço todo o meu vazio. Não aquele que enloquece, que entristece. Que faz com que eu me perca entre o "se", o "quase" e o "talvez". Não o vazio cheio de dúvidas e de incertezas. Não o meu vazio ausente de significados.

Te ofereço todo o meu vazio que encontrei. E que nunca busquei. O limpo. Límpido. Cheio. O que falta mágoas e ressentimentos. Aquele que varri tudo aquilo que me sobrava, que preenchia com fotos rasgadas. Fatos distorcidos, diminuídos em seu exagero. Toda a consequência dos dias vividos e remexidos.

Ainda não nos encontramos. Sequer nos conhecemos. Mas este será o meu presente. Todo o meu vazio, que sequer ansiei. Um vazio que não se enxerga, mas sabe-se lá. Aqui. Que me preenche da forma mais simples e singela. Se sente. E aumenta. Não se explica nem se entende.

Quase paz, não chega a ser minha calma. Talvez ainda não tenha transcendido meu vazio, que quase não cabe em mim. Por isso te entrego. Te dou de presente. Me dou. Em toda finitude sem fim.

Te entrego. Mas já te aviso que meu vazio não vai aos pedaços. É inteiro. Indivisível. Completo. Basta em si. Todo ele que consegui assim, sem querer. Preencheu sem completar. Pois não veio em partes. Um vazio todo composto por nada. O nada mais lindo que já senti sem entender.

E entrego a você. Que não conheço. Nem nunca vi. Só sei que sinto. A você que sorri com os olhos e, com todas as cores, muda meus sentidos sem mudar os significados.

A você, capaz de afirmar que, de vazio mesmo, ele não tem nada. A você que não o enxerga, mas acredita. E me sente, sem querer. E que seria incapaz de me separar do meu vazio. E que se basta com ele. Me basta.

Toma. Ele é teu. Para você.

domingo, 4 de janeiro de 2009

Meu único desejo para 2009

Sou bastante aversa a fazer planos nas viradas de ano. Apesar que, mesmo a contra-gosto, resolvi repensar um pouco nessa coisa toda esse ano e fiz um único desejo. Só um. Todo o resto eu vou resolvendo. O que eu quero, pra onde eu vou, se é que não fico. Conforme as folhinhas do meu calendário forem sendo arrancadas.

Quero esquecer todos os meus desamores. Aqueles amores vencidos. Vividos pela metade. Pela minha metade. Aqueles amores que passam pela sua vida e parecem que nunca vão embora. Continuam ali, meio que remexidos. Amanhecidos, feito pão de ontem. Meio esbranquiçados, sem muito gosto. Que você pega quando tem fome e que, no fundo, não mata a fome nem tira aquele gosto de ressaca da noite anterior.

Eu sempre tive uma quedinha por certas coisas mal-resolvidas. Sempre deixava a porta mal fechada. Um sofrimento em vão. Que não dói, só incomoda. E é como certos vícios. Você sabe que faz mal, as pessoas que cultivam um carinho sincero por você te avisam que faz mal, mas você mantém. Eu mantenho. Tenho a sensação de precisar desses desamores pra me sentir viva. Saber que eu continuo sentindo algo. Que não estou morta.

E, sendo assim, meu desejo para 2009 é morrer. Sentir o nada. Quero o nada de dor, de incômodo. Quero o vazio. Deve ser difícil para quem viveu boa parte da vida cultivando o pouco. Comendo o pão amanhecido [e as migalhas!]. Mas quero sentir todo o meu vazio. Fechar minhas portas, janelas, telhados e varrer tudo que ficou dos anos anteriores.

2008 passou e eu sobrevivi. 2007 foi um ano de cão nesse quesito. Bati meus recordes. Comi o pão que o diabo amassou, depois de 1 semana assado. E foi bem pior que pão amanhecido. Namorei um traste que até bem pouco tempo atrás eu ainda acreditava ter me ensinado alguma coisa. Pois é. Precisei me amarrar na frente do espelho e me forçar a enxergar que eu aprendi sozinha e que ninguém me ensinou nada coisa nenhuma. Juntei meus caquinhos até conseguir admirar o mosaico que se formou com todos eles. Minha avó bem dizia: “menina, você precisa se dar valor”. Pois é, vó. Demorou, mas eu estou começando a entender o que é que tinha atrás desta frase que sempre me pareceu banal e repetitiva. Mas ainda tenho um looongo caminho pela frente. Infelizmente.

Chegou 2008. Não pedi nada. Não me esforcei pra nada. Ou melhor. Olhei pra todas as outras partes da minha vida. Mudei de emprego, reatei amizades. Cuidei do meu corpo e da minha alimentação. Li muitos livros. Vi todos os filmes que tive vontade. Vivi minhas loucuras. Me aceitei nas diferenças. Fui segura de mim. Revisitei minhas características peculiares. Ri e chorei sozinha. Tomei alguns porres. De birita, de felicidade, de paixão e de tristezas profundas. E fui levando de desamores em desamores. Amores vazios.

De certa forma, fiz questão de não ter perspectivas. Aparentemente. No fundo, acreditei que tudo seria diferente com cada pessoa que cruzou meu caminho. E hoje me admira ter feito isso. Eu que sou tão cética. Seca. Que gosto tanto das coisas fundamentadas em bases sólidas. Só não chego a ser contraditória pois acreditei tanto no que não foi dito que me bastava acreditar por acreditar. Criei todas as minhas verdades. E fingi que não estava nem aí. Que estava tudo bem e era tudo muito bom para todos os meus pseudo-amores. Como se eu me bastasse. Como se…

Claro que hoje já sei que vivo muito bem sozinha, obrigada. Que minha felicidade e loucura não depende de nada nem ninguém. Não sou mais aquela menina que cruza os dedos e fica esperando a tampa da sua panela. Aquele cara que aparecerá de all star, cabelos bagunçados e que goste dos meus livros e interprete filmes e textos da mesma forma que eu. Mas de certa forma eu enxerguei tudo isso e mais um pouco nas pessoas erradas. Nas que eu escolhi durante o ano passado. Talvez todos eles tivessem um pouco de tudo isso. Mas ainda faltava tanto… Mesmo já sabendo que eu me bastava, esperei certas coisas de quem não tinha nada a me ofercer. Ou tinha muito pouco.

Entre a ressaca deste Natal e do Ano Novo, conversei com um dos meus desamores sobre o que parecia não ter muita relação com tudo isso. Pois é. Desses desamores, conversava com todos, até hoje. De certa forma, esse jeito cortês e educado de dizer que as coisas acabaram é só um disfarce pobre de se manter certo tipo de relação. “Tudo terminou, até o que não foi começado. Fiquei em cacos 1 semana e agora somos amigos”. Não éramos amigos até então. De onde veio toda essa amizade? Hoje vejo que perdi energia e espaço na minha vida pras reais coisas que não aconteceram no momento em que destinei espaço pra tudo aquilo que nunca deu certo. E logo eu que aprendi ainda no primeiro semestre da faculdade que os recursos são escassos.

Conversando com um entre tantos dos meus desamores, ele me disse que entre todos, eu tinha me apaixonado por ele porque eu sabia que ele poderia ser tudo aquilo que eu esperava de alguém. Cheguei a concordar com ele. Mas é aquele ditado: “de boas intenções o inferno tá cheio”! Cansei de ter vocação para caça talentos. Projetos mal acabados de homens para estar do meu lado.

E eu que sempre gostei das reticências, escolhi o ponto final para dar sentido pra 2009. Se não quero mais amigos? Claro que sim. Mas amizade se começa de uma forma diferente. Não acho que todos os homens das minhas relações que foram sendo levadas em banho-maria são descartáveis. Eles seriam ótimos amigos se não tivessem ocupado outro papel na minha vida. Já tive um teretetê dos bons com muitos dos meus amigos. Esses continuam amigos até hoje. Mas não é deles que eu estou falando. E eles sabem. Mas os outros nunca foram. Não nasce uma amizade de um relacionamento superficial. Já até cheguei a acreditar nisso. E hoje me parece algo como “finge que você diz a verdade que eu finjo que eu acredito”.

Não sou o tipo de pessoa que guarda mágoa. Eu prefiro perdoar, sempre. Só acho que agora eu preciso ME perdoar. E fazer as coisas por mim. Tentei sempre agradar a todos, ser A civilizada. Educada. Cortês. Fazendo as coisas pelos outros. Levando. E esqueci de mim. Não parei pra pensar no que preenche meu vazio. No que me alimenta. E fui vivendo de pão amanhecido [e de migalhas].

Sempre acreditei nas boas intenções que só se mantiveram como ótimas boas intenções. Agora, só quero acreditar vendo. Vendo, sentindo e vivendo. E quero, antes, viver meu vazio. Andar no chão mesmo que outras pessoas tentam me fazer acreditar que, nessas circunstâncias, é melhor andar em cima do muro.

Quero queijo no meu pão, por favor. Pão de hoje.

sábado, 3 de janeiro de 2009

E agora?



E agora que eu voltei.

[Mas não queria...]

2008 terminou. 2009 começou. E já são 3 dias riscados na folha do calendário. Pulei as sete ondas. Não fiz nenhum pedido. Deixo que 2009 e eu entramos em acordo conforme os dias se passam. Vamos negociar um dia de cada vez. É melhor assim.

Expectativas levam a alguns lugares. A frustrações, com certeza. Me bastam alguns quereres, vontades e certezas na vida. Independente de sair dezembro e entrar janeiro.

E pessimismo nada tem a ver com tudo isso. Hoje só prefiro um dia de cada vez. Gosto do feriado, dos fogos, de brindar o novo ano. Gostei especialmente deste ano. De pisar na areia e lavar os pés com sal grosso natural. Sentir cada abraço dos 42 que senti. Nenhuma boca. Amanhecer descalça longe de casa. Independente de acreditar ou não no tudo novo.

Nisso, acredito sempre. Um dia de cada vez. Balanços diários. Deve ter a ver com cautela. Falo em meses, no máximo. Cada ano é muito longo pra tentar resumir e apresentar em tabelas. De sazonalidade na minha vida, só TPM. Com sorte [ou azar, dependendo do ponto de vista].