terça-feira, 25 de agosto de 2009

Sobre a loucura

Comecei a pensar hoje sobre a minha loucura. Até porque de "santo e de louco todo mundo tem um pouco". Lembrei do dia que te conheci e do livro da Martha Medeiros que estava no banco de trás do carro quando te deixei em casa: "Doidas e santas", e que senti uma pontinha de vergonha de ler Martha Medeiros. Lembrei do que você me disse nos nossos primeiros cinco minutos de conversa, a alguns meses atrás. Você me disse que eu tinha jeito de quem trabalhava com qualquer coisa, menos com Economia. Como quem diz que eu parecia ter menos regras e que provavelmente levava a vida sem muitos modelos e teorias fixas.

É, eu sou assim. Pois é, um paradoxo tão óbvio que até uma criança de 9 (ou 19?) conseguiria perceber. E você não foi a primeira pessoa e nem a última a reparar. Lembrei daquela noite e senti nostalgia. Da sensação de leveza que eu sentia de quem pode até esperar alguma coisa de um sábado a noite, mas não de um domingo.

Lembrei e me perguntei por que raios eu estava lembrando de tudo aquilo, depois de tanto tempo. E de por que eu ainda estava intrigada. Não me apaixonei porque, sejamos sinceros, não deu tempo. Mas eu ainda sentia uma sensação estranha, de quem não se comportou como a mesma pessoa que é. Talvez fosse medo de me mostrar, medo de ser quem eu me tornei na sua frente. Medo do que você poderia pensar da minha loucura. Da minha forma de viver sorrindo, da minha mania de perfeição, de como eu sofro e choro na TPM, de como eu falo sozinha e faço caretas.

Queria eu mesma aceitar a minha loucura. Minha loucura e minhas vulnerabilidades. Viver em paz com ela e rir dos meus exageros. Aceitar que, como todo mundo, eu também erro. Mas ainda é difícil aceitar, sabe? Senti medo do que você pudesse pensar de mim se você realmente me conhecesse. Não queria que alguém como você percebesse que eu não era boa o suficiente, mesmo sem saber se você mesmo era. Porque, quando te vi, já sabia que sua opinião seria importante para mim, se ela se tornasse opinião. O que você pensasse e o que você sentisse teria valor a partir do momento que eu já te admirava e te considerava.

Fiquei pensando que provavelmente foi por isso que sempre me envolvi com pessoas de menos. Menos idade, menos experiência que eu, menos formação, menos caráter, menos gosto pelas letras e pela matemática, menos apreço por filmes europeus e iranianos. Desinteressantes. De alguma forma, as pessoas que acabaram entrando na minha vida destinadas a ir embora não se encaixavam nas minhas escalas de valores. A opinião delas era café com leite, tanto faz como tanto fez. Uma forma eficiente (e covarde, é verdade!) de não sofrer.

E, pra não sofrer, todas as vezes que aparecia alguém que mostrasse a mínima probabilidade de valer a pena, eu fugia. Não estou dizendo que te vejo e penso que seríamos felizes para sempre e que eu fui a víbora má que fez tudo dar errado. Nem chegamos a nos conhecer de verdade. Não é nada sobre você, e sim a forma com que te imaginei.

Por te imaginar uma pessoa interessante - e por ter algumas evidências sobre o fato - eu paralisei. Seria menos pior se eu tivesse saído correndo, fugido, sem olhar pros lados. Mas eu estava lá durante todo o tempo para sentir tudo o que eu senti. Por me ver e me enxergar agindo como uma pessoa que eu não sou, falando de menos, com assuntos esgotados. Alguém desinteressante e desinteressada. Morta, paralisada.

Você não me viu. Não conheceu as minhas loucuras. Não apontou meus erros e minhas falhas. Eu quase não existi depois daquele beijo. Por existir possibilidade, todo o resto deixou de existir. Não fui por ser tudo aquilo que eu sou. Por me poupar de sabe-se lá o quê, acabei mostrando uma loucura que não era a minha quando calei e fechei, portas e janelas, voz e sentimentos. Morreram sem viver.

Texto dedicado ao Guilherme. Que talvez pudesse existir além das minhas fantasias

Obs.: como todas as minhas crônicas, essa tem lá sua dose de verdade e sua dose de mentira. Mas como ela está dividida, entre o que foi e o que não foi, esta fórmula eu não revelo. Por não ser tão claro nem para mim.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

De verdade

Quando é de verdade, você não precisa mais ficar colocando no outdoor, demarcando território, gritando aos quatro ventos o quanto realmente vocês se amam e como tudo isso é perfeito. No começo, você sente aquela ansiedade, ainda existe o encantamento, e realmente é isso que você faz. Você fala sem parar, repete milhares de vezes as mesmas coisas sobre o novo amor da sua vida. Para os seus amigos, no twitter, no orkut dele e de todas as suas amigas. Para você.

Só para você. No fundo, você é a pessoa mais insegura do mundo e repete incansavelmente na sua mente, em voz alta, em negrito e em caps lock, pra se convencer. Para tentar acabar com a sua insegurança. Para não pensar no "se" e nas milhares de hipóteses negativas que surgem. Aí você abafa a parte negativa, grita o "tudo de bom que a sua vida se transformou depois do Fulano" e vive feliz pra sempre.

Olha, você não precisa sair espalhando por aí a sua felicidade. Pode ser pior depois. As pessoas já sabem que vocês foram feitos um para o outro e, sério, isso só é importante para vocês dois. Nada mudou na vida das outras pessoas porque agora você anda com cara de boba alegre e tem alguém que anda com cara de bobo alegre por sua causa.

Quando é de verdade, você percebe desde o começo que encantamento - as tais borboletas no estômagos - não passa de azia ou, na melhor das hipóteses, fome. No máximo, é alguma coisa em você tentando te avisar para tomar cuidado porque "ali tem". Quando é de verdade, não existe nenhuma borboleta. Você vai andando, com os pés no chão, talvez na ponta deles: o calcanhar sai do chão, mas a metade de cada um deles continua ali, bem firmes.

Não estou defendendo relacionamentos mornos, sem sentimento. Sentimento é diferente de encantamento. Eu também já confundi muito um com o outro, mas quando é de verdade, fica mais fácil separar. Para sentir e conseguir permanecer ao lado de alguém você precisa ter coragem. Coragem pra viver na realidade e da realidade. Vocês não são tão felizes juntos que se bastam. No meio disso tudo tem chefe, horários loucos, família, prioridades, pensamentos e valores que irão se confrontar vez ou outra e que irão conviver respeitando-se, com humor ou na falta dele.

Para que vocês se conheçam de verdade, vai demorar um tempo. Não 1 mês, nem 1 ano. Um tempo. Para duas pessoas se conhecerem precisa de tempo para convivência, dormir na mesma cama e conseguir olhar um pra cara do outro na manhã seguinte e conseguir se divertir com o mau-humor ou o bom-humor que o outro acorda, dependendo de qual lado você está. E pra conviver é preciso de coragem. Coragem e paciência, pra quando falta a coragem. Você tem que conseguir respirar fundo e contar até dez. Precisa de bom-humor para saber que nada nessa vida tem dois lados bons sempre. Saber que é na diferença que se cresce, que vocês podem brigar de vez em quando mas, ainda assim, você quer continuar ao lado dele por um motivo maior. Ainda vale a pena.

Você não conhece ninguém ainda antes da primeira briga, do primeiro stress, antes de saber qual parte dele é diferente da sua. Antes de saber se ele é capaz de gritar com você ou simplesmente sumir, dizendo que não se importa, ou se ficará em silêncio por 10 segundos antes de segurar a sua mão e olhar no fundo dos seus olhos. Não é de verdade quando você acha que só você o conhece ou que só ele te conhece, ou ainda que só vocês sabem. Ah, existe tanta gente na vida de cada um de vocês capaz de descreve-los de milhares de formas e cores! Só é de verdade quando vocês enxergam a possibilidade de prepotência conjunta e percebem que milhares de pessoas podem, e vivem, algo que vocês dois estão experimentando só agora juntos. Que as situações são sempre as mesmas, que as pessoas, mesmo sendo únicas, se parecem bastante umas com as outras. E nada é assim tão perfeito, ou tão único, que não possa acabar amanhã.

Você sabe que é de verdade quando consegue considerar a possibilidade de estar ao lado de milhares de pessoas parecidas com aquela que está do seu lado - e algumas até melhores - mas, ainda assim, sem explicar muito, você permanece onde está. Sabe que a vida é feita de escolhas e, cada um de vocês escolheu um ao outro. Independente de qualquer coisa - porque "coisas" sempre existem. E todo mundo sabe!

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Sobre ele

É claro que ele tem lá as manias dele. Eu também tenho as minhas. Às vezes a gente se entende. Mas sempre a gente se sente. Como se cada um soubesse a temperatura do outro, sem usar termômetro. E colocamos um casaco ou nos despimos, dependendo da temperatura dentro de cada um. E dos dois juntos.

Eu nunca fui daquelas que espera um príncipe no cavalo branco. Meu negócio sempre foi olhar pros meninos de óculos ou de cabelos bagunçados. E se fosse míope, gostasse de matemática e tivesse os cabelos bagunçados, que usasse lentes de contato ao invés de óculos, também estava de bom tamanho. Até que apareceu ele.

Ele era amigo de um amigo do outro amigo que morava fora a algum tempo e nesse dia eu caí da cama e resolvi sair da proteção da minha casa e viver lá fora. Vesti meu melhor sorriso, um salto (que é a forma que toda mulher usa para aumentar uns centímetros e alguns pontos de auto-estima) e fui tranquila, nem me lembro mais para onde. Eu já havia perdido a minha pressa e as minhas esperanças. Estava saindo com um e com outro que não valiam a depilação do mês. E ainda sofria por eles. Sofria simplesmente pelo costume de sempre sofrer, mesmo que fosse de mentirinha.

Como disse Clarice, "Que se há de fazer com a verdade que todo mundo é um pouco triste e um pouco só?". Eu sempre soube da minha solidão, sempre tive consciência dela, mesmo quando eu me enroscava em outras pernas, em noites quentes que eu buscava certos significados para a química e para os laços frouxos amarrados em fantasias bobas. Noites vazias. O tempo e a realidade me ensinaram a viver só, solta, leve. Aprendi a gostar dessa condição de ausência. Parei de fugir do oco, parei de procurar ensandecidamente qualquer coisa que pudesse me fazer melhor. Aprendi a viver sem me sentir angustiada e sufocada pelo excesso de espaço.

Eu já não precisava mais arrastar os móveis para dançar na sala. E não existe sensação melhor do que dançar no espaço, pro vazio. Me entende quem já se viu sozinha num palco de um teatro, holofotes acessos, plateia apagada. Sem ninguém. Você, o silêncio e ninguém mais.

Pois é, aquela noite, fui viver. Eu, minha solidão, um amigo acompanhado de outros amigos e meu copo de mojito. Ele se aproximou e sorriu. Se apresentou com total desenvoltura. Não me interessei. Ele não gostava de matemática, não era míope. Só tinha os cabelos bagunçados. Foi só quando começamos a conversar, nós dois com todas as outras pessoas em volta, foi que eu o enxerguei pelo contraste. Ele amava viver. Transbordava amor pela vida, por si e parecia se bastar nessa felicidade. Talvez ele fosse um pouco só, mas um pouco triste, duvido. Era quente e ocupava espaço por ser, sem querer mostrar-se. E surpreendia-se na mesma medida que me surpreendia.

A sensação que tenho foi que, ao invés de nos conhecermos, nos reconhecemos. Não por afinidades e por identificação. Talvez eu seja o tipo de pessoa que ainda foge dos espelhos e não queira ainda alguém tão parecido assim comigo pra estar do meu lado. Mas também preciso dizer que dessa vez não quis nada. Não deu tempo. Ele quis por mim e assim foi.

Eu me deixei levar. Pelas surpresas, pela paz, pelo sorriso sincero e por ele não querer demais. Por não querer mais do que eu sou, do que eu posso. Por não cobrar e não me deixar cobrar de mim mesma o que não está ao meu alcance. Por saber me levar nos braços e na lábia, e não ter a pretensão de preencher os meus espaços que são para permanecer como estão. E me deixar saber que a sala estará vazia para eu dançar sozinha quando eu quiser.

Por ele amar viver mais do que me amar, me deixei levar. Por me sentir e se deixar sentir. Por nem questionar quem eu já fui, quem eu sou ou quantos anos eu tenho. E por conseguir permanecer ao meu lado mesmo quando eu mesma fujo de mim, no desespero, na angústia, nas sensações que não passam, no choro da TPM, nas lágrimas de transbordamento, na loucura. Por permanecer ali, sem reação, em silêncio, mesmo quando eu me debato em sombras.

Fico tentando pontuar o que mais amo nele. Gosto do silêncio doce quando me largo nos braços dele ou das nossas risadas de madrugada, sentados na cama, ele contando histórias do cotidiano que me fazem lembrar de como podemos ser feliz ou triste, é realmente só uma questão de ponto de vista. Gosto da forma que ele simplifica a vida e resume os meus dramas particulares, achando graça ao invés de sair correndo, como a maioria sempre fez. Mas gosto de tudo, gosto mesmo do inteiro.

Que todas as noites, e os dias, e todo o resto, continue assim. Enquanto durar. Enquanto a existência nos bastar.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Encontros ao acaso

Se engana quem pensa que este texto trata de contar sobre um lindo e romântico encontro ao acaso, com o grande amor da minha vida. Não, não trata. Até porque não dava pra falar de grande amor da minha vida, assim no singular, já que os dedos das mãos já são insuficientes para contar todos aqueles que já chamei de grande amor da minha vida. Tão comum quanto beber água!

Vou falar dos encontros ao acaso, das pessoas que você encontra onde menos espera. Aquelas pessoas que você conhece, mas faz anos que você não a vê. Aí encontra no meio da rua e você sempre pisca de novo, apertando os olhos, os dois juntos, pra ter certeza que REALMENTE é alguém que você conhece, mas está "meio" diferente. Porque, geralmente, as pessoas mudam com o tempo. Engordam, emagrecem, pintam o cabelo de vermelho (ou verde, ou amarelo, ou todas as cores juntas!), perdem o cabelo, se descobrem gays.

Depois que comecei a morar em São Paulo, isso acontece com certa frequência. Ainda mais quando estou em lugares ou passando por avenidas que todas as pessoas vão, como a Av. Paulista ou qualquer shopping da cidade. E como se diz lá na minha cidade: assisense é praga! Tem sempre um perdido em qualquer lugar que você vá, e eles se multiplicam mais que a gripe suína.

Depois que comecei a dar aula, isso acontece com mais frequência ainda! A última vez foi no casamento de uma das minhas melhores amigas. O casamento aconteceu numa sexta-feira e eu iria dar aula sábado. Eis que, no meio da minha animação, quando todas as amigas de faculdade sobem com a noiva no palco para pagar aquele mico, que eu escuto alguém chamar o meu nome. E não é que era um dos meus alunos da turma que eu daria aula no outro dia? Reação 1: olhar para o copo e se certificar de que realmente eu estava tomando água. Reação 2: não deixar ele perceber que eu não lembrava o nome dele. Reação 3: ignorar as loucas gritando o meu nome de cima do palco, dançando e cantando com o banda.

Pois é, encontro ao acaso, no meu caso, raramente é uma experiência tranquila.

A última foi no final de semana passado. Acordei no domingo, aquele sol, aquele dia lindo depois do dilúvio de sete dias, coloquei um tenis, uma roupitcha de academia, prendi o mísero cabelo que eu tenho do jeito que deu, e fui. Eu e John Mayer no meu Ipod, cantando e andando feito loucos pela rua. Eis que, de repente, eu vejo saindo de um prédio alguém que parecia ter a mesma reação que a minha. Aquela cara de alface tentando ser simpática mas que no fundo você sabe que está pensando o mesmo que você: que raios você está fazendo no meu caminho de domingo?

Era um professor querido que eu trabalho junto mas que com certeza não queria me ver em pleno domingo de férias e de sol no meio do caminho dele. Passou, achei graça e, pelo menos, ele estava tão desgrenhado quanto eu!

Quando imaginei escrever sobre encontros ao acaso, pensei se me lembrava de algo bonito e emocionante, romântico. Do tipo que vemos em filmes, mas não encontrei nenhum nas minhas memórias. E juro que todas as vezes que eu vou ao supermercado eu olho bastante para os lados. E só quem tem puxado papo são as velhinhas simpáticas me pedindo ajuda para enxergar o preço dos produtos ou para dar dicas sobre produtos de limpeza.