segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Hoje acordei diferente

Hoje acordei diferente. Hoje acordei como quem consegue abrir mão de tudo aquilo que não me preenche. Hoje acordei e dei bom dia para o meu vazio e jurei para o espelho que minha escolha, a partir daquele momento, seria não mais venerá-lo.

Por toda uma vida cultivei tudo aquilo que se manteve sempre na superfície e que não existia possibilidade para ser diferente do que era. Tudo aquilo que eu acreditava poder dar certo de alguma forma. Menti a mim mesma que tudo isso, só dependia de mim. Acreditava no que não era e no que nunca se tornaria.

Cultivei as firulas, os detalhes. E me esqueci que detalhes são só coisas muito pequenas e que não significam exatamente nada sem ter algo parrudo para que os detalhes então façam a diferença. Detalhes por eles mesmos não preenchem o vazio, por menor que o vazio se apresente. O que seria de um botão sem uma camisa? O botão só se torna algo desejado quando alguém veste a camisa. Ah… Como é bom brincar com botões!

Hoje acordei diferente e quis uma camisa com muitos botões. E principalmente alguém que a vista para que eu possa despí-lo para me despir. Qualquer coisa menos que isso não me serve, se tornou inútil.

Hoje acordei cansada e achando sem graça tanta coisa… Tanta coisa que me impulsinou durante toda uma vida. Aquela vida vivida até ontem. Cansei de caminhar na corda bamba, entre a dor e o desejo, esperando encontrar o amor.

Vivi até hoje acreditando que muitos amores poderiam ter sido e não foram. Mas quer saber? Nenhum deles poderiam ter sido. Todos eles, sem exceção, se tornaram amores só por eu amar demais. Porque eu amei demasiadamente os fracos espasmos que apareceram na minha vida. Eu só queria um botão. E um botão não é nada sem uma camisa…

E por amar demais, amei de menos…

Por ser fraca e não escutar tudo que chegava aos meus ouvidos aos berros, cultivava os detalhes. Os pequenos momentos insignifcantes (e um tantinho belos) eu fazia virar um um amor que poderia ser. E que nunca foram.

O amor, aquele que eu quero hoje, ecoa. Te devolve tudo aquilo que você sente e faz. Em alto e bom som. O homem que merece ser amado te enxerga, até naqueles momentos em que você desejaria ficar invisível. Conhece seu gosto e seu cheiro na mesma proporção que você conhece o gosto e o cheiro dele.

Hoje acordei querendo um amor proporcional e deixei de lamentar todos aqueles amores que não foram. Eles não poderiam ter sido… E assim foi.

Hoje ainda estou me acostumando com a assertividade que escolhi vestir depois do banho. Comecei a desacreditar nas histórias mal começadas sem embasamento emocional.

Desacreditei que certas coisas podem dar certo quando uma de duas pessoas mantém expectativas no menor patamar possível. E que precisamos ser perseverantes e levar um dia de cada vez. Vivendo um dia de cada vez, míopes, esperando quase nada de quase ninguém é quase morrer a agulhadas.

Até ontem vivi em agulhadas por tentar entender as pessoas que vivem no menor patamar de expectativas. Me sentia sendo cozida em banho-maria e angustiada e louca por querer sempre um pouco mais. Me culpava por não conseguir entender muito bem o que seria esse maldito menor patamar e esperava quietinha, doendo. Como se um dia pudesse ser.

Destruí tijolo por tijolo do meu castelo e não pretendo procurar nada que se salve nas minhas ruínas. Não pretendo mais encontrar o amor entre a dor e o desejo. Demorei para entender que todos os amores que poderiam ser, de fato não poderiam. E parei de lamentá-los. Abandonei meus velhos vícios.

Acordei e olhei minha vida vivida de forma rastejada, implorada por pouco. Não pretendo mais fazer das tripas coração por nada nem ninguém. E isto não diz respeito a nenhum surto egocêntrico porque ainda não sei ser assim. No fundo acho que só deixei algumas coisas tomarem seus lugares naturais e parei de insistir no vazio.

Tratei de pregar todos os botões numa camisa porque os botões soltos já estão ausentes de significância. Deixei que aqueles que são um amontoado de detalhes não tenham mais espaço na minha vida se continuarem a ser detalhes soltos. Depois de insistir em insistir, abri mão. O superfluo permanece também na minha superfície e deixa, então, de me afetar.

Conteúdo e bem mais que inteligência. Bem mais que frases bonitas de efeito. Se duvidar, já prefiro as coisas simples, de homens com menos melindros, menos lustre, menos lantejoulas. Pode parecer mais do mesmo, mais do comum. Mas o comum, o simples é diferente para mim.

Acordei desejando o mundo real, que ainda é mais interessante que o sonho tumultuado e vago. Acordei, enfim.

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