Fui dormir com uma estranha sensação de que eu pudesse acordar no outro dia e me arrepender do que eu não tinha feito. Quem nunca escutou a frase "é melhor se arrepender daquilo que você fez"? Eu sempre vivi mais ou menos assim, escutando meu coração e agindo por impulso. Naquela noite não. Tinha recebido um convite tentador e neguei. Não foi pela falta de vontade. Como eu queria estar nos braços dele de novo! Não fui pra tentar evitar sofrimento. Mais ainda: não fui porque queria bem mais do que aquele homem podia me oferecer e já deixou de ser justo comigo mesma aceitar menos do que eu quero. Até porque não quero nada vindo de outra dimensão nem nada próximo da perfeição. Mas não me sinto mais à vontade de dividir a cama com quem não possa me oferecer o coração. E o coração dele já está ocupado.
Nunca fui aquela que jogou pedra em quem traía. Eu mesma já traí. E muitas vezes ajudei a trair. Já estive em todos os lados de um relacionamento quando o assunto é traição. E em todas as vezes, em cada uma dessas situações, algum momento foi muito bom. Já traí, já fui traída e já fui amante.
A primeira vez que eu traí eu namorava a algum tempo. Meu namoro estava sem graça, eu era nova e estava viajando. Beijei um cara numa balada e foi horrível. Não existia a menor afinidade, eu me senti culpada e aquilo não significou nada pra mim. Voltei em dois dias pra cidade que eu morava e pro meu namorado, que nunca ficou sabendo da história. Ele só achou que alguns dias longe fizeram bem pra gente e eu estava muito mais carinhosa com ele. Bem típico! A segunda e última vez que eu traí eu estava namorando por carência. Tinha cansado de ficar sozinha, queria alguém pra estar do meu lado que me entendesse, pra passear de mãos dadas. Estávamos em um bar e eu beijei um cara que me paquerou a noite inteira no corredor do banheiro. Ele também nunca ficou sabendo mas acabei terminando o namoro porque aquele cara me mostrou que eu fui tão baixa que meu namorado em questão não merecia passar por isso, mesmo que não soubesse. Se eu realmente gostasse dele, não teria assumido tal risco. Percebi, traindo, o quanto meu namoro não tinha futuro. Não foi por pena nem por auto-punição que terminei o namoro. Foi só por ter enxergado além.
Já fui traída e perdoei. Passei por cima, relevei. Não fez a menor importância, pra mim, na época, saber que o meu namorado tinha ido pra cama com outra. Foi difícil perdoá-lo mas foi mais difícil me perdoar por tê-lo perdoado. A vida seguiu, continuamos juntos mais algum tempo e o namoro terminou por outras milhares de questões que não partiram da traição. Não aconteceu só uma vez, com uma única pessoa. Mas não foi diferente em nenhum caso.
Mas o que mais aconteceu foi eu estar no lugar de amante. E eu sempre repeti que não tenho vocação pro cargo. E não tenho mesmo! A primeira vez eu estava com um cara a algum tempo. Eu pensava que ele tinha terminado o relacionamento de alguns anos a um tempo e eu descobri, por acaso, que a ex-namorada era, na verdade, namorada atual, quase noiva. Meu chão sumiu. Me senti mal, culpada e vagabunda. Até chegar na terapia em prantos e a minha psicóloga disse: o namoro dele é problema dele. Você está solteira e ele está com você porque ele quer. Agora, se você quer continuar com ele mesmo você tendo consciência disso, isso é problema seu. Se você tem estrutura emocional para manter isso, siga em frente. Eu segui, sozinha. Não consegui levar adiante aquilo, não por moralismo ou por achar que o que ele estava fazendo era errado. Mas sim porque eu queria alguém inteiro do meu lado e isso ele não poderia me dar.
Outra vez, entrei no papel de amante sabendo de tudo que estava acontecendo. Era um namoro falido. Ele estava se sentindo traído (porque tinha sido mesmo!), mas não tinha coragem de terminar. Ele ainda gostava dela mas não conseguia perdoá-la. Como uma forma de aliviar a culpa que ele sentia em estar com alguém que não poderia perdoar e se sentir traído, resolveu fazer igual. Com o tempo, percebi como eu salvei e mantive em pé o namoro dele. Passávamos a semana juntos, nos víamos quase todos os dias. Ele dizia que ia pro poker com os amigos e acabava na minha cama. Ele não conseguia terminar o namoro nem tampouco parar de me encontrar. Resolvi dar um basta na história e me afastei. Em menos de um mês depois, o namoro dele terminou. Chegamos a nos encontrar de novo mas não foi a mesma coisa. E nunca mais seria.
A última vez que fui a amante foi a bem pouco tempo atrás. Foi tudo muito rápido e dessa vez eu não sabia nada do relacionamento em questão. Não quis, não perguntei. Mas depois que aconteceu, me flagrei imaginando qual seria a motivação dele. Porque sempre existe aquilo que nos leva a fazer o que fazemos. Pode ser por impulso, por paixão. Ainda assim deve ter algo que nos move. Pelo pouco que eu soube - juntando pedaços, textos e comentários soltos - não consegui identificar qualquer tipo de problema. Mas eu não tinha nada que entender por que raios ele não estava com a namorada dele. Talvez eu devesse me preocupar só com o fato dele estar comigo. Não me senti mal - como muitas mulheres levantam pedras para jogar - de fazer com ela o que eu não gostaria que fizessem comigo. Sempre escutei esse discurso barato entortando um pouco a boca e não palpitando sobre o assunto. A responsabilidade era dele, não minha. Eu estava com o meu coração vazio e em paz e sabia exatamente onde eu estava pisando. Sabia que não tinha o menor direito de esperar algo dele além de uma aventura. Muito menos de julgá-lo.
Aliás, eu não julgo nada nem ninguém. Não tenho esse direito a partir do momento em que eu sei exatamente o cenário antes de entrar nele. Não acho que ninguém pode falar em culpa quando se fala em traição. Eu tenho um amigo - casado, aliás - que diz que casos extra-conjugais não interferem no sentimento que temos por aquela pessoa que escolhemos dividir a vida. E ele não fala só por ele, fala pela esposa também. Diz que pode acontecer de existir atração por outras pessoas, até de acontecer algo mais. Mas isso não exclui o sentimento que essas duas pessoas, com escolhas compartilhadas, sentem uma pela outra. Não é cama, nem sexo, nem aventura que vai acabar com o relacionamento dele. E eu concordo. Antes eu não entendia muito, achava graça e taxava de discurso de homem pervertido. Mas confesso que minhas vivências me fizeram entender bem do que ele fala.
E ontem, antes de dormir, eu disse um não. Resolvi não agir de forma passional e impulsiva e me questionei por isso. Por agir diferente do que eu sou. Porque não me maltrato mais por ser passional e impulsiva. Me perguntei: se eu não julgo e não acho errado e sei que isso é um problema do outro, por que raios eu não fui encontrar um cara legal, divertido e que eu gostei de conhecer? Pois é. Acho que tem muito menos a ver com julgamento e valores. Acho que talvez esteja relacionado ao meu momento de vida, ao que eu realmente quero, ao que realmente faz diferença na minha vida hoje.
Não julgo e nem pretendo entender as motivações do outro. Tanto faz se foi por confusão, vingança ou simplesmente aventura que esses homens traíram. Mas hoje sei muito mais sobre mim. Não que eu pense que aventura não seja bom. Só quero, hoje, significar mais do que isso pra alguém. Traições continuarão a acontecer. Aventuras continuarão sendo boas e melhores ainda quando fizerem sentido. Mas hoje, não me arrependi de ter ido dormir sozinha, sem nenhuma história mirabolante pra contar.
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